sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

There Is No Magenta (mesmo?)

O último meme que circula na twitosfera é debater se Magenta, afinal de contas, é uma cor ou não. A origem da dúvida é um artigo intitulado "Magenta ain't a colour", que afirma que não, magenta não é uma cor, ou pelo menos não uma cor de verdade.

Mas e aí? Enfim, o magenta é ou não uma cor? Bem, depende de como você define, e tem duas definições nessa afirmação. A primeira é "o que é uma cor?", mas também tem uma segunda, mais sutil e igualmente não trivial: "o que é magenta?".

Pra podermos discutir o que é o tal do magenta, eu proponho um gedankenexperiment famoso. Suponha que você tenha nascido com problema no sistema visual, e tudo que as pessoas enxergam como verde você veja como laranja, e vice-versa. Seus pais nunca fizeram nenhum exame em você, então simplesmente apontavam pro Hulk e ensinavam: tá vendo, o Hulk é verde.

Esse experimento foi proposto pelo John Locke, e até hoje filósofos e estudiosos da cognição o usam pra discutir sobre o qualia. Independente disso, uma observação mais simples é que não importa em qual estado sensorial o menino esteja, ele vai chamar o Hulk de verde porque é assim que seus pais o ensinaram. O nome das cores não está ligado apenas às percepções sensoriais: cores são construtos culturais.

Por exemplo, se eu tivesse nascido no japão feudal, meus pais me ensinariam que a cor verde chama Aoi (青い), nome dado para a cor da maçã que não está madura. Mas essa cor Aoi também é a cor do céu e a cor da água. Então, pros japoneses antigos verde e azul eram a mesma cor?

Incrivelmente, sim! Pra eles o verde e o azul eram apenas tons diferentes de Aoi, da mesma maneira que nós temos azul claro e azul escuro. Com o tempo eles criaram uma outra palavra, Midori (緑), pra falar especificamente do conjunto "Aoi que não é azul". E quando querem falar do azul propriamente dito, hoje em dia eles falam Burú (ブルー), copiado do inglês Blue.

Isso ocorre em todas as culturas. Pra gente, o azul é uma coisa só, mas um americano pode dizer que Blue é só o azul escuro, e aquilo que a gente chama de azul claro na verdade é Cyan.

Por isso, quando eu li o título do artigo, minha primeira dúvida foi: mas de qual magenta ela está falando? O que ela chama de magenta é o mesmo que eu chamo de púrpura? Ou é roxo? Violeta? É a cor da calça do Hulk?

Ler o artigo original não ajuda, pois lá ela afirma que magenta é a mesma coisa que pink, e aqui na minha cultura isso são coisas diferentes: magenta é a cor no meio do azul e do vermelho, rosa é o vermelho desaturado.

A moral da história é que se você quer afirmar alguma propriedade a respeito de uma cor, não chame a cor pelo nome pois depende de locale. Ao invés disso, é melhor usar uma descrição quantitativa.

No fim das contas, o que autora queria dizer mesmo é que #FF00FF não é uma cor de verdade, e isso eu vou mostrar no próximo post que é falso também :)


PS: Aparentemente eu não tinha cumprido a promessa de dois posts por mês, mas isso é porque eu tive que viajar para a Índia, e os posts acabaram indo para um blog novo só sobre a viagem. Se você quiser ler as bizarras aventuras do Ricbit na Índia, basta visitar o India Broadcast.

11 comentários:

  1. Ricbit, a cor azul não se chama 青 apenas? 青い acho que é o adjetivo, e adjetivo não dá nome à nada, NAAAAAAAADA!!! XD Bom, não tenho tanta certeza do que estou falando. Comente ae.

    Outra coisa que notei foi quando escreveu "Burú". Acho que o correto é burū, com macron.

    Legal que isso me fez pesquisar e agora sei digitar palavras usando macron :D

    Link para quem se interessar:
    http://en.wikipedia.org/wiki/Help:Macrons

    Exceto isso, adorei o post.
    Abraços!

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  2. Cara, ótimo post sobre cognição e afins, to bem curioso pra ver a segunda parte :)
    Abraço.

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  3. Aoi é o adjetivo, o nome da cor propriamente dito eu acho que é 青色 (Aoiro, cor-de-azul, do mesmo jeito que aqui no Brasil a gente usa cor-de-rosa).

    O lance do burū é que eu não estava romanizando, estava dando a pronúncia :) Se fosse pra romanizar, hepburn e tal, burū seria melhor mesmo.

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  4. Mas magenta não aparece no espectro natural de cores porque na verdade o magenta é uma combinação de outras duas cores, no caso azul e vermelho.

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  5. Isso é falso. Tem um monte de cores que são combinações de outras duas, e que aparecem no espectro eletromagnético. Se o magenta é diferente das outras, é por outro motivo, e isso eu vou explicar no próximo post :)

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  6. Essa história de "o que é uma cor" me lembrou de um pedaço dos livros do Monteiro Lobato onde o Visconde de Sabugosa defendia que branco não é cor, porque não existem pigmentos brancos.

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  7. Eu pintei minhas unhas de magenta neste fim de semana em homenagem ao seu post, hoho. ;-)

    Magenta, ame-o ou deixe-o! :-P

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  8. Oi Ricardo,

    magenta é uma cor, sem dúvida. Só que não existe uma luz monocromática que produza a percepção da cor magenta. Pode-se dizer, grosso modo, que luzes monocromáticas são percebidas como cores. O inverso é que não é válido: nem todas as cores percebidas correspondem a luzes monocromáticas. Por exemplo, você também não encontraria uma luz marron. naturalmente, isso não quer dizer que essas cores não ocorreriam na natureza. Teoricamente, poderiam existir por exemplo pinguins magenta ou marrons :)

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  9. Existem pingüins marrons! A primeira penagem dos pingüins imperadores é marrom, eles só ficam preto e branco depois de adultos.

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  10. Eu aprendi que a cor rosa é apenas um vermelho devagar!

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  11. Outro fator importante a considerar é que, mesmo sem nenhum tipo de problema ou doença, pessoas diferentes percebem cores de forma diferente. Algumas pessoas tem maior habilidade para diferenciar tons do que outras, e isso pode variar de uma cor para outra numa mesma pessoa.

    Assim, algumas pessoas podem não diferenciar magenta de pink, por exemplo, enquanto outras consideram as duas completamente diversas.

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